
As mulheres da pandemia: uma rede feminina essencial para a cidade
Quando uma médica, uma enfermeira, uma policial, uma higienizadora, uma técnica em informática, uma cobradora de ônibus, saem de casa para garantir o sustento da família, uma rede feminina se forma. Outras mulheres passam a atuar como "guardiãs" de filhos, dos pais, das residências, da vida, das primeiras, principalmente se elas fazem parte do batalhão da linha de frente contra o coronavírus.
No Brasil, não é de agora que mulheres assumiram, financeiramente, suas famílias. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que cerca de 45% dos domicílios brasileiros são comandados por mulheres. E, por isso, elas não puderam parar, nem mesmo durante a pandemia. Entre enfrentar o medo da contaminação, adaptar-se aos novos tempos e se posicionar no mercado de trabalho, as mulheres, em Pelotas, criaram uma corrente, economicamente ativa, essencial para a cidade.
Nos últimos depoimentos da série em homenagem às mulheres, vamos conhecer profissionais de setores essenciais, que se mantiveram atuantes mesmo nos momentos mais difíceis da pandemia em Pelotas. Mulheres indispensáveis para a cidade e para muitas outras mulheres.

Carla Rosane Pinheiro Trotta, 59 anos, babá - cuida da filha de uma médica
"Sinto-me uma pessoa muito útil, nesta pandemia, pois para ela atuar na linha de frente (a médica para quem trabalha) precisa de alguém de confiança para cuidar da sua filha. Ela sai tranquila para ajudar os outros, por causa da pandemia, pois sabe que deixou a filha bem cuidada. Acho muito importante que todos se ajudem, não só as mulheres, pois se todos fossem assim, iriam progredir na vida. A pandemia trouxe a distância de não poder visitar as pessoas e, na parte profissional, em me resguardar para não prejudicar ninguém. Sobre ser mulher, acho que, hoje, no mercado de trabalho, estão surgindo mais oportunidades e nos estudos também. Quero que todas tenham mais oportunidades em todos os sentidos - que tenham os mesmos direitos".

Melissa de Souza Rabassa Colvara, 40 anos, professora
"Mudou tudo e me vi tendo aulas para preparar, com um pequeno de quatro me chamando o tempo todo, e também tinha as atividades da escola dele. Meu marido seguiu trabalhando. Isso sem contar a loucura das aulas a distância. Os prejuízos da pandemia na educação são grandes. Nós, professores, assim como os alunos, lutamos com os recursos que tínhamos. Nosso aluno caiu de paraquedas no meio de um 'ensino remoto'. Sou professora de Matemática. Ensinar presencial já é complicado... a distância, ficou foi extremamente difícil. Esforcei-me, gravei aulas para os alunos, mas sem os equipamentos certos é sempre um desafio maior. Pelo fato de, culturalmente, ainda termos a ideia de que o filho e a casa são de responsabilidade nossa, acabamos sobrecarregadas. Hoje, faço parte de um quadro profissional que é, na grande maioria, feminino. Então, não vejo desvalorização por ser mulher - por ser professora, sim. Mas, aí já entramos em outra questão. Já trabalhei em empresas grandes, nas quais os cargos de maior salário eram de homens. Por isso, desejo que as mulheres sejam o que quiserem ser! Que possam ir aonde e quando quiserem! Que tenham oportunidades para isso!"

Cleusa Vaz Duarte Soares, 55 anos, taxista
"A dificuldade maior para exercer a profissão, nessa pandemia, é a função de ter o filho em casa, ter família. Aí tu sais de manhã, olha para o passageiro, não sabe se ele está ou não está contaminado, se ele tem ou não tem. Aí, tu arriscas e pensas assim: 'Vou trabalhar. Se eu ficar em casa, pago minhas contas como? Vou tirar de onde para me sustentar?' Tem que arriscar. Na rotina do táxi, mudou a função da higiene. Eu faço sempre assim: passo álcool nos bancos, esterilizo tudo e sempre estou de máscara. Tenho máscaras de reserva no meu carro. Se o passageiro vem sem máscara eu dou uma para ele usar. Na pandemia, sinto que as pessoas dão preferência para andar comigo porque se sentem mais seguras. Acho que é porque eu mantenho mais cuidado até na higienização do carro. Acho que eles sabem que a gente, mulher, se cuida mais ainda e se sentem mais protegidos, mais seguros. Eu meto a cara, eu sou de encarar. Então, acho que, nas outras áreas, as mulheres deveriam encarar mais. As mulheres no futuro têm que procurar ser mais independentes, não depender tanto do homem, que é a razão do homem se achar superior, mas a mulher deve ser independente em todos os sentidos".

Bárbara Lopes Rodrigues, 25 anos, tecnóloga em Redes de Computadores
"A minha profissão é uma das bases da tecnologia, mantemos no 'ar' serviços dos mais simples aos mais essenciais. Logo que começou a pandemia, nos tornamos cientes que serviços críticos, como a saúde, iriam demandar mais atenção, afinal é a frente de tudo. Foi aí que a percepção de que não posso parar foi mais forte! As distinções acontecem, principalmente, devido ao gênero e à idade! A minha profissão como um todo é extremamente consolidada por homens. Isso traz um tabu de que mulheres não entendem o que estão dizendo (tecnicamente) e dão voz aos homens primeiro. Mas, hoje, na equipe técnica do setor, sou a única mulher e agradeço à minha equipe por saber respeitar e escutar, independente do gênero. Acredito que a pandemia pode abrir portas para mulheres como eu. Mas, acredito que, para mudar por completo esse comportamento preconceituoso, não podemos ser vistas apenas nesse momento. Tem de haver um trabalho contínuo em relação à cultura que a área da tecnologia da informação carrega. Acredito ser superimportante a divulgação das ações de mulheres como eu, que não pararam. Que possamos ser livres para escolher em qual profissão atuar, sem ser subjugadas apenas por sermos mulheres!"

Cíntia Arnold Kabke , 42 anos, cobradora de ônibus
"Sempre fui uma pessoa que trabalhou. Eu nunca tive muito tempo para casa, para os filhos. Então, o que eu acho que mudou bastante, por causa da pandemia, foi a rotina de realmente ficar em casa, de ver a vida com outros olhos, ter mais tempo com meus filhos, poder cuidar de mim. É um sentimento de medo, de preocupação, mas é uma coisa que é necessária, não tem o que fazer nesse momento. Muitas vezes, tu vês que tu te cuidas, deixas de fazer várias coisas e as pessoas não fazem isso. Até mesmo no transporte público, tentamos ao máximo o distanciamento, higiene, mas as pessoas usam a máscara de maneira incorreta, não se higienizam, então tudo isso é preocupante. Hoje, a mulher atua em várias profissões, mas ainda é pouco. Ainda existe uma sociedade machista. Devemos ensinar nossos filhos sobre a importância da mulher na sociedade que, independente de qualquer coisa, deve haver respeito".

Patrícia Villela Fouchy Soares, 43 anos, feirante
"Levantar de manhã e ter que ir na cama do meu filho, pegá-lo e levá-lo junto comigo para feira foi a pior fase dessa pandemia. Ele tinha que ficar isolado, dentro do caminhão, para podermos trabalhar. Sabíamos que no momento em que entrássemos no caminhão teríamos contato com ele. Se estivéssemos contaminados, ele seria contaminado também. Mas, isso me tornou uma 'leoa', porque, a partir do momento que tu tens que sair da tua zona de conforto para trazer o sustento para dentro da tua casa e o teu filho ter que ir junto, tu tens que te tornar mais forte. Sem contar que a pandemia trouxe as aulas on-line. Além de feirante, dona de casa, tive que me tornar a professora, tive que me tornar a colega, tive que me tornar a recreadora. Trouxe mais atividades para o meu dia a dia, mas, ao mesmo tempo, conseguimos, e foi muito gratificante ter conseguido, superar. Eu sou do tipo de mulher que não é pouca coisa que me intimida. Eu sou de ir lá, meter os 'peitos' e fazer. Para mim, não tem universo masculino. Para mim, o universo é amplo e é geral e, onde tiver que entrar, eu entro. Existem, sim, mulheres ainda submissas a si próprias, não se dão valor, elas próprias ainda se intimidam com algumas coisas. Mas, eu prefiro dizer que as mulheres estão adquirindo o seu espaço conforme o passo que estão dando. Desejo que todas as mulheres sejam muito autênticas, determinadas e certas do que querem".

Renata Rodrigues de Souza, 48 anos, gerente de produção (trabalha em uma padaria)
"É muito tenso. Eu e minha família estamos em isolamento social há um ano e vejo algumas pessoas com a vida social normal e isso me apavora. A minha maior preocupação é que tenho, em casa, três crianças e eu convivo com várias pessoas que não tomam o mínimo cuidado para evitar uma possível contaminação, pois, mesmo eu tomando o máximo de cuidado, tenho receio de levar a Covid para casa. Sinto-me essencial, como todos que estão trabalhando, deixando suas casas e enfrentando, eu não posso ser diferente. Sim, há diferença ainda para as mulheres, mas acho que somos desvalorizadas porque não nos valorizamos. As mulheres têm de ser mais independentes, estudar, se profissionalizar, crescer como pessoa, como ser humano, se conhecer mais, se valorizar mais, ter mais dignidade e amor próprio. Que possamos ter a sensibilidade de nos conhecer, nos amar mais, de priorizar e fazer acontecer tudo o que sonhamos, através do nosso trabalho, do nosso estudo, da nossa dedicação e do nosso esforço".
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